O GDOC (Grupo Docente da UFPR Litoral), foi criado em 25/05/2011, com o objetivo de discutir assuntos relacionados à ação docente na UFPR Litoral.

quinta-feira, 22 de março de 2012

Universidade e Produtivismo Acadêmico

Diario de Pernambuco, Seção Opinião, Segunda-feira, 19 de março de 2012.

Universidade e produtivismo acadêmico 
João Morais de Sousa Prof. Adjunto/UFRPE joaomsousa@uol.com.br

Estão trocando a essência, o conteúdo, o qualitativo e o ser pela aparência, a estética, o quantitativo e o ter. Um exemplo é “menos Luiza, que está no Canadá”, virar assunto nacional nas redes sociais e telejornais, sem conteúdo e importância alguma. Estamos na época do descartável e o que mais se descarta são pessoas, sobretudo, quando deixam de ser “produtivas” e “consumistas” para o mercado.

Na universidade, predomina os ditames do produtivismo (forma de avaliação, valoração e hierarquização da produção acadêmica) encampado por órgãos e agências de fomento como o CNPq e a Capes. Tem que ter faro canino na construção do Lattes. Rosna-se grosso professores com publicações recheadas de qualis A, ser pesquisador A1 do CNPq e pertencer a Programas de Pós-graduação que possuam nível de 5 a 7 da Capes, ainda que possua apenas meia dúzia de leitores. Publicar apenas em periódicos qualis C, mesmo com muitos leitores, o lattido sai fino. Agora, se a produção for volumosa, estiver no prazo e bem qualisada, mais convites o professor recebe para conferências, congressos, simpósios, seminários, bancas de concursos e defesas de teses. O modelo impõe: a produção significa status, prestígio e poder. A felicidade é um detalhe. Assim, alguns professores sentem-se semideuses, outros deuses e uns para além de deuses. Ah, o prazo de validade do qualis é curto e em certas circunstâncias varia somente de 1 a 3 anos, e deuses são destronados. É o que vem acontecendo com muitos professores que veem seus súditos e séquitos lhes abandonarem do dia pra noite, quando são descartados de programas de pós-graduação por falta de produção qualisada e lattidos fortes. Muitos estão adoecendo devido às pressões sofridas. As doenças de origem cardiovasculares, estresse, depressão e tédio são as mais comuns.

O produtivismo acadêmico fortalece o corporativismo, o apadrinhamento e o individualismo. Professores e pesquisadores de instituições de “referências” editam periódicos, formam grupos de pesquisas, promovem eventos (seminários, encontros, congressos) e fazem permuta nas publicações para evidenciar caráter público, democrático e republicano de suas ações e publicações. Entretanto, prevalecem os interesses pessoais, particulares e locais desses poucos “divinos”.Há os que radicalizam na crítica ao produtivismo e não produzem Lattido nenhum e até inviabilizam quaisquer construções. Para estes, não se aplica a justa reivindicação de melhorias nas condições de trabalho, cargos, salários e aposentadorias que muitos combatentes ao modelo, mas produtivos, vêm travando. É preciso redefinir os parâmetros da produção acadêmica de forma a ela impactar como o estabelecido nas missões das Universidades , sobretudo as públicas, que dizem voltar-se para uma formação cidadã, desenvolvimento regional, diminuição da pobreza e da desigualdade social. Essa é a Universidade pública que a maioria da população deseja e quer construir: autônoma (sobretudo em relação ao mercado), de qualidade, para todos e formando pessoas felizes e comprometidas na luta por uma sociedade mais justa, humana e solidária. Em que a qualidade, o conteúdo, a essência e o ser sejam os parâmetros de construção. 



segunda-feira, 5 de março de 2012

Qual é sua profissão?

Qual é sua profissão? Será que você se identifica com a descrição abaixo? 
 
           Você não formou em administração, mas tem que administrar o caos com o mínimo de infra-estrutura e dinheiro, dirigir reuniões sem fim nas quais todos se acham os verdadeiros chefes natos. Não é, necessariamente, formado em direito, mas tem que trabalhar em diversas comissões de cunho jurídico e para tanto tem que virar a noite lendo e entendendo das leis.
          Talvez não tenha se formado em arquitetura nem decoração, mas tem que orientar (muitas vezes pagar) a organização de seu espaço de trabalho, comprar armários e mesas e material de escritório. Não se formou, necessariamente, em secretariado, mas tem que atender e responder chamadas (geralmente do seu celular porque não dispõe de ramal para todas as salas), organizar agenda de forma que tarefas que geralmente são executadas em 7 dias sejam realizadas em 24 horas (e durante 24 horas corridas!), responder a 50 emails no mínimo por dia (antes de encontrar com a pessoa que te enviou no corredor e ser cobrado!), e tudo isto datilografando perfeitamente com todos os dedos para não perder tempo, corrigir (quando não redigir) as atas das reuniões, etc, etc. Não é mais estagiário da Cruz Vermelha, mas ainda tem que levar correspondência ao correio, levar ofício em outro departamento com o SEU carro, material para xerocar, para encadernar, etc, etc. Não é empresário, mas gerencia uma micro-empresa para a qual tem que inclusive arranjar financiamento para que ela funcione.
           Não trabalha na NASA, mas tem que fazer projetos a altura desta para conseguir financiamento para seu trabalho. Não se formou, necessariamente, em contabilidade, mas tem que fazer relatório financeiro para prestar contas de projetos e mais contas para os recursos disponibilizados possibilitarem o fim do projeto. Não é estoquista, mas tem que conferir material, cuidar para não vencer ou acabar o material de consumo e cuidar do material permanente como se fosse seu, e rezar para não dar defeito pois, certamente, não terá recursos para arrumar. Não é, necessariamente, formado em letras, mas tem que ler,
falar e entender fluentemente no mínimo 3 idiomas e além de escrever, tem que revisar periódicos em todas as línguas. Não é, necessariamente, formado em Estatística, mas tem que dominar todos os modelos de pesquisa e as mais variadas análises, assim como as diferentes representações gráficas. Não fez, necessariamente, Relações Internacionais, mas tem que fazer parceria com o mundo todo para dar conta de projetos preferencialmente “sem fronteira”.
             Você tem a felicidade de não bater ponto e conta isto como vantagem (isto porque não conseguiram instalar o ponto na sua casa para registrar as horas extras). Quando você fala que vai ficar em casa trabalhando ninguém acredita, e sua família não entende porque você só fica em casa …trabalhando…Se você fez graduação, especialização e mestrado, sua formação nunca é suficiente e certamente fez ou terá que fazer doutorado e pós-doutorado (no mínimo 3 em 3 continentes diferentes)  e com toda essa formação ganha o mesmo salário que muitos profissionais que tem formação inferior. Sempre perguntam se “Você só dá aula?” e você tenta explicar sem sucesso que esta é a parte mais fácil do seu TRABALHO, e para “só dá aula” ainda tem que abrir a sala, arrumar as carteiras, montar o projetor, levar o seu computador e rezar para tudo funcionar…
             Você tem direito a 45 dias de férias no ano e não consegue tirar nem 15(e certamente os Fiscais Federais do Trabalho não irão fiscalizar e nem multar seu patrão!). Mas tudo bem, você viaja a Congressos e pensam que você tira 90 dias por ano pois só vai lá para passear. Se você ministra aula para um curso bem avaliado pelo ENADE e disseram que você não fez mais do que sua obrigação OU se o curso que você ministra aula foi mal avaliado pelo ENADE e a culpa certamente foi considerada sua e de seus colegas que não estão trabalhando direito.
             Você tem que fazer ENSINO (na graduação, na pós-graduação, na especialização para complementar a renda – se o TCU deixar), PESQUISA (de ponta!) e EXTENSÃO e ainda integrar tudo isto junto com a administração, a produção científica e a orientação de não menos  que 5 ou mais alunos de pós, 5 ou mais de graduação, comissões especiais, bancas especiais, reuniões especiais, eleições e cargos especiais, etc, etc, etc, (tudo especial!), E se é da área de saúde, meu amigo, agora é sério, estou com mais dó de você do que de mim. Se não é, apoie seu amigo da área. Ao menos desta estamos fora: ouvi falar no refeitório que vem aí o MEC com mil propostas inovadoras de residências, tudo com prazo, para ontem, você perde suas férias para enviar o projeto, vai dar mais aulas, vai orientar mais pessoas, vai atender mais pacientes e NÃO vai ter esta atividade reconhecida em seu relatório anual (é um bico… sem adicional, que fique claro!). 
           E se tudo isto não bastasse, se para atingir o nível máximo de sua carreira, depois de fazer tudo isto você ainda terá que provar para uma banca que tudo que você fez foi importante para a sociedade, foi verdade e não foi só sua coisa de sua imaginação, e torcer para liberarem vaga para o “cargo máximo” antes de você se aposentar (o que é fácil para uns, mas muito difícil para outros, sem ter nada com política gente!), Nem tudo é desvantagem, você provavelmente ainda tem o direito e o luxo de assistir ao Fantástico (do lado direito uma tese para ler e corrigir para banca na segunda feira e do lado esquerdo o processo para dar o parecer e todos depois de discutirem horas em reunião, chegarem a conclusão que o seu parecer não tem o menor sentido!).
           Bom… a esta altura existem as seguintes possibilidades: 
1) você ainda não se identificou e não é ESTE PROFISSIONAL,
2) você se identificou…então é grave, vamos parar por aqui, antes que você aumente o número de ESTE PROFISSIONAL que está lotando os consultórios de psiquiatria. 
SIM, VOCÊ É UM PROFESSOR UNIVERSITÁRIO FEDERAL 40 HORAS COM DEDICAÇÃO EXCLUSIVA. SUA FAMÍLIA TEM CERTEZA DISTO EXCETO QUANDO VÊ O SALÁRIO NO FIM DO MÊS!!
            Em tempo de carnaval … se divertir pra quê? Vai ler, escrever, corrigir, planejar, organizar, estudar … Olha o lattes aí gente!!!! ou parte para a opção da covardia: finge não ser ESTE PROFISSIONAL (como tantos por aí, e não assume metade das funções acima e deixa para os demais e se vangloria da sua esperteza de ganhar o mesmo salário e o pior: passa e é aprovado na avaliação de desempenho). É… e pensar que eu sou um DESTE PROFISSIONAL com muito orgulho, pois sei que contribuo e sou essencial para a sociedade. Mas o salário… bom, se você é ESTE PROFISSIONAL sabe como é! Não é a soma de todas as pseudoprofissões que você exerce!! E nem proporcional a sua carga horária de trabalho…       

AUTOR MUITO CONHECIDO
 
Ana Amélia Cardoso
Terapeuta Ocupacional
Professora Adjunta - UFPR
Doutora em Ciências da Reabilitação - UFMG